segunda-feira, 10 de outubro de 2011

O passarinho

Reginaldo era o faz-tudo da empresa. Não tinha nada que não pedissem a ele.

- Reginaldo, pega meu vestido na lavanderia? – pedia Clarisse.
- Reginaldo, vai lá no banco e paga essa conta pra mim. – mandava Daniel.
- Ô Reginaldo, o pé da cadeira quebrou, dá um jeito nisso faz favor? – era outro pedindo.

E, assim, o dia de trabalho passava rápido. Ele mal chegava, já estava na hora de ir embora. Sempre ocupado, sempre de um lado para o outro. Sempre disposto.

Era Sexta-feira, fim de expediente e o chefe mandou chamá-lo. Quando entrou na sala, Reginaldo logo reparou numa gaiola coberta em cima da mesa.

- Reginaldo, o negócio é o seguinte, preciso que você leve essa gaiola neste endereço. – e lhe entregou um papel com o nome da rua e o número de onde deveria ir. – A pessoa só vai estar lá até às 18h, então, pega o dinheiro do táxi com a Clarisse e se manda! E cuidado com isso, ok? Na Segunda-feira você vai buscar a gaiola antes de vir para cá.
- Sim senhor! – o faz-tudo respondeu com um sorriso.

Reginaldo pegou a gaiola com o maior cuidado e saiu da sala. Clarisse lhe deu um envelope com R$100 para o táxi de ida e de volta.

- O chefe disse que não precisa troco.

Então, ele pegou o dinheiro e foi embora carregando a gaiola. Chegando à rua, olhou o relógio e viu que ainda era quatro e meia da tarde. Foi aí que Reginaldo achou que seria uma boa ter aqueles R$100 no fim de semana e, para isso, bastaria ir de ônibus. Não titubeou. Olhou o endereço no papel que o chefe lhe dera e seguiu de busão mesmo. O que Reginaldo não contava é que um acidente envolvendo um caminhão tombado causaria um engarrafamento fora do comum, atrasando-o mais do que poderia. Nervoso, Reginaldo desceu do ônibus às 18h05 e, correndo com a gaiola na mão, chegou ao endereço quinze minutos depois da loja de animais já ter fechado. Sem ter o que fazer, resolveu levar a gaiola para casa.

- Caramba, o que que eu digo para o chefe na Segunda-feira?

Preocupado, Reginaldo chegou em casa e colocou a gaiola sobre a mesa da sala. A mulher foi logo perguntando do que se tratava.

- Que ideia é essa Reginaldo? Não vou ficar limpando caca de passarinho não, hein? Vou logo avisando!
- Esta gaiola não é minha não, é do chefe. Ele me pediu para levá-la numa loja, mas eu cheguei lá e já tinha fechado. O pior é que ele me deu o dinheiro para o táxi e eu resolvi ir de ônibus achando que daria tempo, mas me ferrei. Agora, nem sei o que digo a ele na Segunda-feira.
- E que passarinho que tem aí?
- Você sabe que eu nem olhei? Eu acho que a gaiola tá vazia, porque não ouvi um pio sequer.
- E pra quê que ele ia te dar uma gaiola vazia pra levar pra loja?
- Ah, sei lá, vai ver que ele comprou um passarinho e me mandou à loja justamente por isso.
- Você não perguntou homem de Deus?
- Eu não! Eu só faço o que me pedem. Não faço perguntas.
- Mas, então, levanta logo esse pano que eu quero ver se tem ou não um passarinho aí dentro!

E Reginaldo fez o que a mulher pediu. Mas foi só levantar o pano para ele perder a respiração e começar a gaguejar.

- Que... que... hã? Co-como assim?
- Fala homem, que que tem aí dentro? Um urubu?
- Não mulher, tem um passarinho morto!! Eu matei o passarinho do chefe!
- Morto? E agora? O que você vai fazer? Teu chefe vai te mandar embora por isso!
- Será?

E naquela noite Reginaldo não pregou o olho. Não parava de pensar na burrice que tinha feito pegando aquele ônibus lotado, tendo que sacudir a gaiola pra tudo que é lado. – É claro que o passarinho não aguentou o sacolejo e o calor infernal. Bateu as botas! O que é que eu faço?

A mulher, solidária ao jeito dela, contou pra vizinha o ocorrido e, em pouco tempo, o drama de Reginaldo se espalhou na vizinhança. Muitos vieram oferecer um passarinho vivo para ele substituir o pequeno defunto, mas eram completamente diferentes do passarinho do chefe.

- Toma aí Reginaldo, leva esse que lá em casa eu tenho muitos.
- Mas esse é amarelo e o morto é verde, não dá pra usar o teu.
- Tá, tudo bem, eu só queria ajudar. Quanta ingratidão!

Reginaldo estava desesperado. Já passava do meio-dia de Domingo e ele ainda não sabia o que fazer. Até que, por volta das 14h, a mulher entrou em casa gritando.

- Reginaldo, Reginaldo, corre aqui!
- Que que foi? Por que essa gritaria?
- O primo da dona Josefa tá aqui e disse que tem um monte de passarinho em casa, inclusive verde. Falou pra você ir lá com ele escolher que, com certeza, vai ter um igual.

E lá se foi Reginaldo correndo com a gaiola na mão, agarrado àquela possibilidade. Quatro horas depois, ele voltou sorridente para casa. Com a gaiola e um passarinho verde e vivo!

- Conseguiu Reginaldo? – perguntou a mulher.
- Consegui! Mas me custou os R$100 do táxi que eu quis economizar. No final, esse dinheiro não era para ser meu mesmo. Ah, mas eu tô aliviado. Graças a Deus! O chefe nem vai perceber, é igualzinho! Agora, eu vou dormir, porque eu tô um bagaço!

No dia seguinte, Reginaldo chegou mais tarde na empresa, para parecer que tinha passado na loja. Foi direto à sala do chefe e colocou a gaiola sobre a mesa.

- Obrigado Reginaldo. Eu estava ansioso para vê-lo. Você deu uma olhada nele?
- Dei não senhor. Do jeito que eu levei a gaiola, eu trouxe. Toda coberta.
- Então, fique aí para ver que belezinha.

Mas quando o chefe levantou o pano, fitou o passarinho verde, que piscava e olhava para todos os lados, e ficou mudo. Reginaldo não pôde acreditar. – Como ele reconheceu que não era o passarinho dele? Eram idênticos!

- Reginaldo, o que é isso?
- Ué, um passarinho verde chefe. – ele respondeu sentindo o coração apertar e pensando “estou frito”.
- Eu sei que é um passarinho verde, eu estou vendo isso!
- Então, não entendi sua pergunta...
- Reginaldo, o passarinho que estava nessa gaiola, estava morto! Eu te mandei levá-lo na loja, porque minha filha estava inconformada e eu prometi que iria mandar empalhá-lo!

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