domingo, 24 de junho de 2012

O encontro


- Oi, Vivi, bom dia!
- Bom dia, Francis.
- Já ouviu a última?
- Não. O quê é?
- Parece que o Renato, do Marketing, saiu de casa, se separou da mulher.
- Jura? Quer dizer, ah, que pena...
- Ah, sei, sei. A mulherada tá pirando, o cara é um gato!
- Mas é super sério também, não dá confiança.
- Não dava, né? Porque era casado, agora, não é mais.
- E você sabe o motivo da separação? A mulher não ia largar um gostosão desse à toa.
- Estão dizendo que ela gosta de “colar velcro”.
- “Colar velcro”? Como assim?
- Caramba, Vivi! Ela gosta de mulher!
- Nossa! Coitado, o Renato deve estar arrasado.
- Sim, e precisando de um ombro amigo, não?
- Francis, você está absolutamente certa! O problema é que a mulherada vai atacar geral.
- É verdade, Vivi. Vai ser uma disputa e tanto!

Depois da conversa com a amiga Francis, Vivi não conseguiu mais se concentrar no trabalho. Passou o dia distraída, a ter fantasias das mais diversas com o Renato, do Marketing. De casamento com filhos à pura luxúria, ela não parava de pensar nele um minuto sequer. E assim se repetiu por um longo tempo. Mas, à medida que os dias foram se passando, os pensamentos foram ficando menos intensos e Vivi foi deixando a história de lado, voltando a ser produtiva no trabalho. O problema é que havia atrasado demais suas tarefas, tinha muito serviço acumulado. Então, numa quinta-feira qualquer, decidiu que ficaria até mais tarde, para dar conta de tudo. Lá pelas 20h, resolveu ir à máquina de café. Precisava andar um pouco, esticar as pernas, alongar os tendões, estava exausta, mas ainda faltava uma tabela a preencher.

Vivi se dirigiu ao corredor onde ficava a máquina de café. A iluminação estava pela metade, as baias vazias pelo caminho, silêncio absoluto. – Que tranquilidade! – disse a si mesma. – Poderia ser assim todos os dias!

Aproximou-se da máquina, escolheu um café com leite sem açúcar e, enquanto aguardava a bebida ficar pronta, ouviu uma voz grave atrás de si.

- Boa noite, Vivi!

Imediatamente sentiu o sangue a subir-lhe às faces, queimando-as como ferro em brasa. Virou-se lentamente.

- Boa noite, Renato! O que faz aqui a esta hora?
- Bem, eu ia lhe perguntar o mesmo, mas já que você perguntou primeiro... é justo que eu responda. Amanhã, farei a apresentação de uma nova campanha, para um novo cliente, então, preciso ter certeza que tudo correrá bem, por isso, resolvi revisar todo o material antes de ir embora. Acho que daqui a uns trinta minutos eu termino.
- Ah, ok, isso é muito importante!
- Sim. Mas, e você? O que te levou à hora extra?
- Muitas e muitas planilhas com dados desatualizados. Andei meio “ausente” ultimamente e deixei acumular o serviço. Mas, agora, está tudo sob controle novamente. Quer dizer, estava, até você aparecer. – esta última frase Vivi disse entre dentes, quando se virou de costas para Renato para retirar seu café com leite da máquina.
- Perdão?
- Não foi nada. Quis dizer, que bebida vai querer?
- Ah, pode ser um café puro, com muito açúcar. Obrigado.

“Tão másculo”, ela pensou enquanto olhava estática para os botões da máquina, sem saber o que deveria fazer.

- Está tudo bem, Vivi?
- Hã? Sim, sim, está, claro. É que sempre tiro o açúcar das minhas bebidas e... enfim, deixa pra lá. – ela apertou o botão.
- Espero que não seja nada de mais.
- O quê?
- O motivo da sua “ausência”.
- Ah, isso? – e agora? dizer o quê? pensa rápido, pensa, pensa, pensa! – Na verdade, eu andei ajudando minha irmã com a filha. Minha sobrinha tem seis anos e andou meio doentinha e eu estava dando uma força a ela. – Meu Deus! Que história ridícula foi essa que você inventou? Por que o fim do mundo não começa agora? Primeiro eu, primeiro eu!
- Puxa, que legal da sua parte! Muito mesmo! Mas está tudo bem com ela agora?

Vivi se virou para retirar o café da máquina. “Você é ótima! Que ideia genial! Orgulho de você, garota!”, pensou com um enorme sorriso na alma.

- Sim, está tudo bem, sabe como é, criança se recupera super rápido. Ela ficou uns dias comigo e nos divertimos muito.
- Que máximo! Sabe, desde que me separei, meus filhos estão morando comigo, e eles são fabulosos, mas sinto falta de algumas coisas.
- Ah, você se separou? Eu não sabia, sinto muito, muito mesmo.
- Não? Pensei que todo mundo já soubesse. Acho que foi notícia por semanas.
- É mesmo? Bem, não costumo ouvir conversas de corredor sobre a vida dos outros, acho isso muito desconfortável.
- Sabe, Vivi? Estou surpreso. Trabalhamos juntos há tanto tempo e eu não sabia que você era uma pessoa tão especial. Ajudando a cuidar da sua sobrinha doente, se mantendo longe das fofocas. Você é muito íntegra!

“Certo, tá batendo uma pontinha de remorso, mas, são coisas que eu poderia fazer, então, eu poderia ser íntegra dessa forma. Foco, foco, foco, você quer sair com ele ou não quer?”

- Que é isso, Renato, assim você me deixa encabulada. Mas, me diga, de que coisas você sente falta?
- Ah, sinto falta de sair com alguém, mas é tão difícil, sozinho com duas crianças pequenas. A mãe aceitou um emprego em outro país e ficará fora por, pelo menos, dois anos. E eu não confio em ninguém...
- Entendo. Deve ser difícil mesmo.
- Se é! Veja, eu gostaria de jantar com alguém diferente no Sábado, mas não tenho companhia...
- Eu posso ser sua companhia! – Deus! Como você se oferece assim? Cadê a integridade?
- Jura? Você está falando sério? Não posso aceitar. É como se estivesse fazendo isso por caridade.
- Caridade? Não! Farei isso porque gosto de você, porque nos conhecemos há muito tempo e ficarei feliz com isso.
- Mas tenho duas crianças.
- Amo crianças! Lembra? Minha sobrinha?
- Então, é sério? Posso marcar um jantar para o Sábado?
- Seríssimo! Pode marcar, estarei lá!
- Nossa, uau! Hum, você pode chegar por volta das 20h?
- Claro!
- Ok, ok, amanhã eu te dou o endereço.

Renato abraçou Vivi feliz da vida. Vivi se deliciou com o cheiro do perfume que exalava da nuca dele. Ambos felizes, voltaram às suas baias para concluir o que ainda estava pendente. Desnecessário dizer que Vivi não conseguiu concluir a planilha, nem se concentrar durante todo o correr do dia seguinte. A sexta-feira passou lenta, Renato enviou-lhe o endereço e celular por e-mail, exaltando-a e agradecendo-a por se revelar tão boa amiga. Devido à apresentação ao novo cliente, ele não apareceu na empresa naquele dia. Ela estava tão excitada e deu graças a Deus quando Francis ligou dizendo estar muito gripada e com febre e que, por isso, não iria trabalhar. A amiga, com certeza, perceberia sua agitação e ela não queria contar a ninguém sobre esse encontro, pelo menos, por enquanto.

No Sábado, Vivi acordou cedo. Tinha uma agenda cheia até às 20h. Depilação, corte, pintura, escova, podólogo, pedicure, manicure, banho de lua, vestido novo, sapato novo, roupa íntima nova. O plano era ir bonita, mas sem exagero, afinal, iria jantar com Renato e as crianças, tinha que estar simples. Também comprou uns brinquedos para surpreender os fedelhos. Se tivesse sorte, eles cairiam no sono cedo e poderia rolar um clima entre ela e Renato.

“Sim! Nada estragaria aquela noite tão especial. Estava entrando na vida íntima do homem mais desejado da empresa. Ela, sem dar em cima dele, foi convidada pelo próprio para jantar em sua casa!”

Às 20h05 ela chegou ao apartamento de Renato.

- Oi! Você chegou! Entre!

Renato deu-lhe dois beijinhos nas bochechas e conduziu-a para dentro.

- Crianças venham aqui! Esta é a moça bonita de quem falei para vocês, a Vivi.
- Vivi, este é o Dudu, ele tem seis anos. E esta é a Nanda, ela tem quatro anos.
- Ah, que amores eles são.
- Olha, não tenho como te agradecer por isso, vou ficar te devendo essa!
- Devendo?
- Sim, eu não confiava em ninguém para tomar conta das crianças, então, eu nunca saía. Hoje, finalmente, terei meu primeiro encontro! Graças a você! Olha, fique à vontade, a cozinha é ali, sirva-se do que quiser. O quarto das crianças é naquela porta e você já tem meu celular. Ligue-me se precisar de qualquer coisa.

Renato se virou para trás e chamou.

- Francis, anda, a Vivi chegou, vamos perder a reserva no restaurante!

7 comentários:

Érika Perez disse...

Adorei!!

Cristiane Lira disse...

Valeu, Érika, obrigada!

Lu disse...

Sem palavras para o francis!!!
kkkkkkkkk Adorei tbm

Cristiane Lira disse...

Que bom, Lu!

Juliana Branquinho disse...

Sensacional!!! Coitada da Vivi, que situação...rsrs

Alice disse...

Hahaha... Excelente... COMO SEMPRE!!!

Eu já imaginava q a Vivi teria alguma surpresa desagradável e desconfiei do sumiço da Francis na sexta, mas achei o encontro deles na cozinha à noite, além de inesperado, muito engraçado com as elocubrações dela...

Parabéns! Ansiosa pelo próximo conto. Bjs

Cristiane Lira disse...

Obrigada, Juliana!

Obrigada, mais uma vez, Alice!!